O Diferencial da Pixar

(19 de jun. de 2015)




Divertida Mente conta a história de Riley, uma menina de 11 anos que sofre com a mudança que seus pais estão fazendo para outra cidade. Contudo, o filme explora o interior de seu cérebro, onde vemos constante conflito entre as diferentes emoções: alegria, medo, raiva, nojo e tristeza, até que a alegria e a tristeza acidentalmente são ejetadas para fora da sala de controle cerebral e precisam navegar o cortex para retomar seu lugar ao lado das outras emoções. O filme, que é a mais nova produção da Pixar, vem fazendo bastante sucesso no Festival de Cannes.

E com o filme prestes a estrear nos cinemas, essa é uma boa hora para rever o histórico desse estúdio.





Como alguns já sabem, a Pixar teve seu início na década de 1980 quando Steve Jobs comprou a companhia de computação gráfica das mãos de George Lucas e a batizou com o famoso nome. A idéia de generar animação via computação era vista como uma nova fronteira a ser conquistada. Contudo, o fato da Pixar ser a pioneira nesse ramo não foi seu único diferencial. Qualquer estúdio dedicado e bem financiado poderia produzir animações em computação, como foi o caso da DreamWorks Animation e do Blue Sky Studios, dentre outros. A Pixar não se contentaria com tão pouco...




Por ter firmado parceria com a Disney, e contratado animadores como John Lasseter, Pete Docter e Andrew Stanton, a Pixar procurava contar histórias que ninguém jamais poderia imaginar, levando o potencial narrativo da animação ao seu nível máximo.


Foi assim que surgiu Toy Story. Baseando-se nos brinquedos da própria infância, Lasseter, Docter e Stanton foram capazes de explorar território desconhecido ao contar uma simples história de abandono e inveja. Só que a história estava sendo contada do ponto de vista dos brinquedos, mais especificamente de Woody (Tom Hanks), que sentia-se privilegiado por ser o brinquedo favorito de Andy. A partir dali, a Pixar foi capaz de se diferenciar narrativamente, contando histórias inusitadas e carregadas de emoção, formando uma conexão forte com seu público.




Não contente em dedicar animações apenas para o público abaixo dos 10 anos, as tramas desses filmes sempre almejaram explorar temas universais que atingem a todos, sejam eles crianças, adultos ou idosos de todas as idades. Um dos trunfos da Pixar sempre foi a de conseguir reacender nossa curiosidade infantil.





Talvez o fato mais surpreendente deste estúdio tem sido sua habilidade de produzir continuações que superem a obra original. Geralmente, a regra em Hollywood (e ocasionalmente na Disney) é de produzir mais do mesmo, sem assumir riscos desnecessários, suprindo as expectativas do público. Ao criar Toy Story 2 e 3, Lasseter e sua equipe de animadores e contadores de histórias foram além do esperado e exploraram novos lados de Woody e Buzz, mostrando principalmente o crescimento de Andy e o eventual abandono da parte mais visível de sua infância: seus brinquedos. Podiam ter contado uma história mais simples, sem grandes conflitos e aproveitando-se do humor visual com os brinquedos. Não era o suficiente para as ambições dessa equipe. O fato de ter tido uma espera de 15 anos entre o primeiro e terceiro filmes mostra esse compromisso. Era necessário tempo para achar a história certa a ser contada e elaborar um roteiro que agradasse a essa equipe.




E vale lembrar que essa dedicação não começou com Toy Story. Logo após a fundação do estúdio na década de 1980, os animadores se especializaram em curta-metragens. Foram esses curtas que pouco a pouco foram convencendo a Disney a arriscar tudo em um longa.



Muito também se fala do ambiente de trabalho dentro da Pixar. Estúdios de animação, assim como cinema live-action, operam em ritmo industrial, com muito trabalho e pouco espaço para fugir dessa maré de repetição. Isso não significa que a Pixar seja uma companhia improdutiva e incapaz. Muito pelo contrário, diversas histórias já foram rejeitadas por não atingirem o padrão desejado e animadores foram passados para outros projetos. Mas é considerado um dos melhores lugares para se trabalhar no mundo. Pete Docter mesmo disse que sempre sentiu-se privilegiado de poder cometer erros e corrigí-los sem sofrer com isso, como foi o caso de Divertida Mente, cuja data de estreia foi adiada por problemas de roteiro.



Toy Story pode ter sido o carro-chefe, mas a Pixar foi capaz de expandir seu acervo narrativo muito além desse ponto. Houve Vida de Inseto que por coincidência teve de dividir seu espaço com outro filme sobre insetos na mesma época, Formiginhaz da DreamWorks Animation. Essa foi a oportunidade para a Pixar mostrar uma trama parecida e ao mesmo tempo diferenciada.

Todavia, foi com Monstros S.A., em 2001, que o estúdio lançou um filme com a mesma ambição e criatividade que teve com o primeiro Toy Story. Ao explorar os medos básicos de bicho-papão que toda criança sente ao dormir numa cama sozinha no escuro, Stanton e Docter conseguiram criar um mundo inusitado onde os monstros operam em linha de montagem industrial com acesso a cada porta de quarto de criança no mundo todo.



Desde então, a Pixar opera com níveis variados de sucesso, seja em filmes criativos e abrangentes como Procurando Nemo ou filmes mais convencionais tais como Valente.



Um filme que também marcou profundamente a reputação da Pixar de forma positiva foi Os Incríveis. Dirigido pelo veterano Brad Bird, a trama de super-heróis aposentados já existia em sua mente antes mesmo de ser adotada pelo estúdio. Foi com essa nova obra que a Pixar começou a sair do lugar-comum e tornar-se um estúdio mais versátil.




Desde o sucesso de Toy Story que se debate até que ponto a Pixar pode ser capaz de chegar com suas histórias. A resposta veio em 2008 com WALL-E. O filme de Andrew Stanton foi o mais próximo possível que uma animação chegou de colocar o espectador numa experiência única similar a de clássicos como 2001: Uma Odisséia no Espaço. Stanton contou uma história de amor intergalática num futuro distópico com pouquíssimos diálogos e uma trilha sonora cativante composta por Thomas Newman.




A Pixar seguiu de imediato lançando UP - Altas Aventuras, filme de Pete Docter em 2009, que abordou a questão da velhice e temas de arrependimento e amor ao próximo. Com isso, muitos chegaram a conclusão de que a Pixar atingiu seu ápice.



Desde então, o estúdio tem tentado manter o público abastecido lançando pelo menos um filme por ano, o que levou eles a explorarem algumas continuações a mais de outros filmes tais como o antecessor de Monstros S.A. (Universidade Monstros). Isso levou alguns críticos e especialistas a ponderarem se o estúdio teria finalmente se rendido ao mal da fórmula hollywoodiana, indo ao poço das continuações, remakes e reboots.

Notícias como a decisão executiva de retirar Brenda Chapman da direção de Valente também tiveram repercussão negativa para a empresa. Com depoimentos de ex-animadores como Chapman, que faziam depoimentos negativos sobre a conduta de Lasseter como líder criativo do estúdio, causaram as primeiras feridas na imagem até então impecável da Pixar. Ao mesmo tempo, a necessidade de adiar Divertida Mente deixou 2014 como o primeiro ano desde 2005 sem uma estreia do estúdio.



Será que a Pixar estaria passando por uma crise criativa?


A recepção aclamada de Divertida Mente indica que não é o caso. O filme está sendo considerado o mais autoral e ambicioso do estúdio desde UP, com fortes críticas positivas e altíssima presença de público.





De qualquer forma, não dá para negar a influência que a Pixar teve. Mesmo não tendo as mesmas ambições narrativas ou a mesma criatividade, estúdios como DreamWorks e Blue Sky existem e operam em ritmo constante com novas produções porque ela trilhou o caminho inicial. O boom de animação computadorizada foi possível graças a essa história.


Existe também o dilema de que o sucesso desses filmes possam ter dizimado as chances de sucesso para animações tradicionais desenhadas a mão. Acreditamos que ainda haja espaço para ambos os tipos de animação conviverem lado a lado, mas esta é uma questão para outro post.

Enquanto isso, confira abaixo o trailer de Divertida Mente.







Posted in Postado por Eduardo Jencarelli às 11:20  

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